Povos de Terreiro
No século XVI, os africanos
trazidos pelos portugueses da costa ocidental da África, conhecidos
principalmente como Congos e Angolas, formaram o povo Banto, originário também
de colônias portuguesas no continente africano. Estes grupos foram alocados majoritariamente
no sudeste do Brasil, onde, até hoje, é perceptível a influência da cultura
Banto. Durante o século XVII, chegaram ao Brasil africanos sudaneses de nações
da Costa d’África, como os Gêge e os Fanti-Ashanti (conhecidos como negros
minas), provenientes da Costa do Marfim. No início do século XIX, europeus
chegaram ao reino Yorubá, e membros dos povos Ijexá, Egbá e Ketu, incluindo
reis, rainhas e integrantes da corte, foram enviados às regiões Norte e
Nordeste do Brasil, sendo a Bahia o principal destino desse contingente.
Esses grupos, forçados a recriar
suas culturas e religiões em uma terra hostil, deram origem a um sincretismo
religioso e cultural essencial para a preservação de um continuum africano, ao
mesmo tempo em que geraram novas formas socioculturais, em contato com as
culturas europeias e indígenas. Léopold Sédar Senghor, um dos principais nomes
da literatura africana moderna, descreveu esse fenômeno como "miscigenação
biológica e cultural".
As fundações dos terreiros de
Candomblé no Brasil começaram a partir do século XVI. O Querebentã Toi Zomadonu
(Casa das Minas Jeje), fundado na década de 1840 por Maria Jesuína (Rainha Nã
Agontimé da família real do Daomé), em São Luís, MA, foi um dos primeiros. O
Terreiro de Xangô, em Pernambuco, conhecido como Ilê Obá Ogunté Sítio de Pai
Adão, foi fundado em 1875. No século XIX, surgiram também importantes terreiros
na Bahia, como a Casa Branca do Engenho Velho, o Terreiro do Gantois e o Ilê
Axé Opô Afonjá, todos da nação Queto. Além disso, há terreiros de outras
nações, como o Terreiro do Bogum, da nação Jeje, o mais antigo dessa tradição
em Salvador. Os filhos e filhas de santo dessas matrizes espalharam-se por todo
o Brasil, formando o que hoje é conhecido como a família de axé.
O Candomblé é um espaço dedicado
ao culto dos ancestrais, conhecido como terreiro, onde a cultura e o
conhecimento são transmitidos oralmente. Cada orixá possui suas
particularidades, como cores, vestimentas, objetos, danças e canções, e se
manifestam apenas nos filhos de santo. Esses ancestrais divinizados estão
ligados aos quatro elementos da natureza: água, fogo, terra e ar. O panteão das
divindades nagô inclui: Exu, Ogum, Xangô, Oxóssi, Ossain, Logun Edé, Obaluayê,
Oxumaré, Oxaguiã, Oxalá, Orumilá, Iansã, Oxum, Obá, Iemanjá, Eywa, Ibeji e Nanã
Buruku. Entre os inquices (inkisi) da nação Angola, destacam-se: Pambu Njila,
Nkosi, Roxi Mukumbe, Ngunzu, Kabila, Mutalambô (Lambaranguange), Gongobira ou
Gongobila, Mutakalambô, Katendê, Nzazi, Luangu, Kaviungo/Kavungo, Nsumbu, Hongolo/Angorô
(masculino) e Angoroméa (feminino), Kindembu, Kaiangu, Bamburucema Nvula,
Matamba, Dandara e Kisimbe.
A resistência é uma prática
diária dos povos de terreiro. Além de existir, formar, continuar e preservar
suas tradições, eles mantêm vivas suas heranças culturais por meio de vivências
e saberes compartilhados. Os terreiros são responsáveis pela salvaguarda de
toda uma cultura e de heranças ancestrais, sendo espaços fundamentais para a
troca de conhecimentos.
As leis 10.639/03 e 11.645/08,
que tornam obrigatório o ensino da história e cultura afro-brasileira e
afro-indígena nas escolas, são fruto de décadas de luta contra o racismo, assim
como o sucesso dos programas de Ações Afirmativas nas universidades
brasileiras, que promovem equidade racial. Enquanto houver desigualdade social,
as cotas raciais continuarão sendo necessárias!